sexta-feira, 17 de maio de 2013

Os três caminhos da criatividade

Por Marcelo Cabral

Muita gente costuma dizer que já fez de tudo na vida. Mas poucos podem dizer isso com tanta convicção quanto o americano Bob Bejan. Formado em Artes Cênicas, começou a carreira atuando em peças da Broadway – e também como músico, cantor e compositor, inclusive criando um disco de rock para as Tartarugas Ninja – a voz original da tartaruga Michelangelo é dele. Daí para a vida executiva foi um pulo. No Vale do Silício, criou uma empresa que fez algumas das primeiras experiências com filmes interativos, antes de ir para a Warner Bros., onde se tornou responsável pela programação e monetização de filmes e programas de TV. Passou também pela Microsoft, onde ajudou a criar o comunicador MSN – desativado no Brasil há poucos dias – e começou a trabalhar com publicidade online. Hoje, Bejan é chefe de desenvolvimento da consultoria de relações públicas MSL e trabalha descobrindo meios de fazer a criatividade alavancar negócios para as empresas. Em entrevista à NEGÓCIOS, ele diz por que é tão difícil para as empresas estimular a criatividade e como foi bancar o Michelangelo para um estádio lotado em Nova York.
Todas as empresas falam muito em apoiar a criatividade, mas são poucas as que realmente fazem isso. Porque é tão difícil implantar processos criativos?
Existe uma combinação de coisas que dificultam a cultura criativa que é vital nas empresas. Em primeiro lugar, há problemas na criação de um ambiente adequado para a criatividade. Ser criativo exige disciplina e estrutura, mas não é a mesma coisa que construir um produto ou criar um serviço. É algo confuso e que exige um componente emocional que é difícil de ser entendido pelas empresas às vezes. Depois, existe também o elemento das pessoas realmente criativas, que são quase um tipo diferente de espécie. Fazer esse tipo de gente se sentir bem é um grande desafio para as companhias. É preciso que esses dois elementos estejam presentes dentro de uma estrutura para criar uma verdadeira cultura criativa. Isso exige foco e trabalho contínuo por parte das empresas.

Como criar essa estrutura na prática?
Eu não tenho certeza que exista uma maneira única de fazer isso. O que eu posso dizer é que você tem que gastar tempo e energia nisso. Todos os dias. Você precisa fazer a criatividade ser parte importante da sua organização, e as pessoas precisam saber que ela tem essa importância. E também é preciso ouvir as equipes, saber como elas estão lidando com esses processos e quais sugestões elas têm sobre como melhorá-lo.

Não é possível acordar um dia e dizer: “hoje eu serei criativo”. Como se incentiva as pessoas a exercitarem sua criatividade?
Existem três coisas que todos nós podemos fazer para cultivar a criatividade em nossa mente. O primeiro é tirar um tempo do dia para sonhar um pouquinho, para pensar livremente, sem se preocupar com as obrigações do trabalho. A segunda é experimentar coisas novas... criando o sentimento de ser “de fora” de uma atividade. Isto dá às pessoas novas perspectivas e isso é uma parte muito importante do processo criativo. Outra coisa a fazer é passar mais tempo com as pessoas que são mais jovens do que você. Isso ajuda a manter uma perspectiva fresca e a lembrar que tudo é possível.

Hoje as redes sociais são vistas como uma das minas de ouro para anúncios. O que você acha desse segmento?
Eu tendo a concordar. Mas a maior mudança na publicidade é que, agora, você tem obrigatoriamente que entregar algum tipo de valor. Por que senão as pessoas não irão ficar indiferentes: elas vão ficar bravas, o que pode ser grave principalmente com o alcance das mídias sociais. Não dá mais para vender “hype”, é preciso entregar valor.

Quais canais de mídia possuem potencial para explodir nos próximos anos? Que novos recursos interativos estão sendo estudados? 
Acho que estamos entrando numa fase de evolução, com uma sofisticação crescente dos elementos que temos em jogo agora. Há muito espaço para avançarmos em mobilidade e computação social, e também na maneira como entregamos conteúdo personalizado e contamos histórias. Para mim, veremos um período do que eu chamo de “ajuste e acabamento”: coisas que já existem, mas cada vez melhores. Dito isto, acho que a tecnologia que você veste está chegando muito perto. Acho que veremos uma explosão de coisas como o Google Glass e outros elementos de inteligência tecnológica construídos em coisas que podemos usar no nosso dia a dia.

Como vê a situação dos jornais impressos? Estão mesmo fadados a desaparecer ou existe futuro para eles? 
O noticiário continuará vivo, como sempre. Mas eu acho que a ideia de algo impresso em papel vai se tornar uma coisa do passado. Em todo o mundo estamos lidando com a questão dos recursos e sustentabilidade. Parece que não podemos dar ao luxo de continuar a usar o papel dessa forma por muito mais tempo.

Como se sente vendo o MSN Messenger desaparecer e ser substituído pelo Skype? Ele havia mesmo chegado ao limite de suas possibilidades?
A internet continua evoluindo e se transformando à medida que amadurece. Da minha perspectiva isso é emocionante, porque em todo o mundo digital tudo aquilo que experimentávamos em meados dos anos 90 está se tornando realidade. Quando você olha para as mídias sociais, percebe que a dinâmica é a mesma que havia nos fóruns e nas comunidades daquela época. Tudo o que existe hoje é o que se queria fazer desde o início da internet, mas que era limitada por uma questão de velocidade de acesso e navegação na rede.

Você também trabalhou com cinema, na Warner. Como vê o futuro para os filmes convencionais frente à pirataria e à internet?
Eu AMO os filmes e acho que as pessoas sempre irão ao cinema. Haverá sempre a necessidade e a demanda de contar histórias lineares e mostrá-los em telas enormes, em grandes salas escuras. Como seres humanos, nós amamos essa experiência. Mas existem muitas outras possibilidades de contar e vivenciar histórias. Quando o cinema foi inventado, todos diziam que ele ia matar o teatro, e isso nunca aconteceu. Cerca de dez anos atrás eu trabalhei em um projeto de filmes interativos para salas de cinema. Ele estava à frente do seu tempo e esbarrou em algumas limitações tecnológicas. Mas à medida que a tecnologia evoluiu, acho que será cada vez mais viável fazer com que as pessoas realmente participem e interajam com os filmes. Continuo esperançoso com esse setor.

Como foi a experiência de fazer a voz do Michelangelo em um disco das Tartarugas Ninjas? 
Eu tive sorte o suficiente para receber a missão de transformar os personagens em uma banda de rock. Eu fiz a voz do Michelangelo, escrevi todas as músicas e letras e ainda criei o show que eles faziam ao vivo, em uma turnê que percorreu o mundo e durou quase três anos. Eu só tinha 29 anos na época e uma das minhas melhores lembranças é cantar o hino nacional americano com a voz do personagem no estádio dos Yankees (em Nova York) lotado, enquanto um ator vestido de Tartaruga Ninja dublava na frente dos microfones. Como foi? Foi incrível!

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