segunda-feira, 8 de abril de 2013

Como as mídias sociais melhoraram a escrita


Por Simon Kuper


Eis um pequeno diálogo que travei com um colega por e-mail outro dia:

Colega: "Achei mesmo que fosse fácil demais. Vou falar com eles e verificar os próximos horários.Obrigado Simon".

Eu: "Desculpe por isso. Basta me copiar e eu cuido do planejamento e facilito sua vida".

Colega: "Não me incomodo. Vamos ver o que ela tem a dizer, mas se a situação ficar complicada, eu me afasto".

Trata-se de um fenômeno bastante moderno: uma comunicação escrita que leva jeito de conversa. Dia a dia, a prosa, felizmente, está ficando mais próxima da fala. As mídias sociais, os blogs e o e-mail melhoraram muito a forma pela qual escrevemos.

Antes da internet, apenas escritores profissionais escreviam. Lembro do semestre em que aprendemos a escrever ensaios, na escola. A maioria dos meus colegas mal suportava as aulas. Jamais haviam escrito seus pensamentos de maneira ordenada no passado, e estavam confiantes em que não precisariam fazê-lo no futuro.

Uma mulher que conheço diz que foi só depois que surgiu a internet que ela percebeu que sua mãe era semianalfabeta. Antes, elas sempre conversavam por telefone, mas com a internet sua mãe passou a enviar mensagens repletas de "!!!!!!!!!!!!!!!!" e "........".

O e-mail estimulou uma expansão sem precedentes no uso da escrita. Vivemos hoje a era mais literata da história. Lembro-me de perguntar a alguém o que era um blog, em 2003; em 2006, a NM Incite, uma empresa de análise, havia identificado 36 milhões de blogs no planeta; cinco anos mais tarde, o número havia subido a 173 milhões.

O uso de mídias sociais cresce a cada mês. De fato, a escrita superou a fala como forma mais comum de interação. A Ofcom, a agência que regulamenta as comunicações britânicas, afirma que os britânicos hoje preferem enviar mensagens de texto a amigos e parentes distantes do que ligar para eles ou conversar em pessoa.

Os pessimistas gostam de definir o processo como morte da civilização --a visão deles é de hordas de jovens mudos trocando mensagens semianalfabetas e solipsistas. John Humphrys, apresentador de TV e rádio da BBC, chegou a descartar os "garotos do SMS" como "vândalos que estão tentando fazer com a linguagem o que Genghis Khan fez com as nações vizinhas".

Ele está errado. Como aponta John McWhorter, linguista da Universidade Columbia, de Nova York, os pedantes vêm lamentando o declínio da linguagem desde pelo menos o ano 63 d.C. Clare Wood, psicóloga do desenvolvimento na Universidade de Coventry, diz que existem poucas pesquisas que ofereçam sustentação a alegações como a feita por Humphrys. Os estudos dela com alunos de ensino básico sugerem que as mensagens de texto resultam em melhor capacidade de leitura. As mensagens, afinal, representam uma prática constante de leitura e ortografia. As crianças tendem a não pontuar suas mensagens de texto, isso é fato. Mas a maioria delas percebe que existem diferenças entre esse gênero de comunicação e as provas escolares, por exemplo. É uma distinção que nós, adultos, estamos lentamente aprendendo. Mal começamos a eliminar as vírgulas em nossas mensagens de texto.

Mas textos, blogs, e-mails, e posts no Facebook infectam outras formas de escrita, e os resultados são positivos no geral. Isso vem tornando o jornalismo, os livros e as comunicações profissionais mais coloquiais.

VANTAGEM

As mídias sociais oferecem um bom modelo sobre como escrever. Primeiro, as mensagens em geral são curtas. As pessoas que usam o Twitter muitas vezes omitem pronomes e artigos. O vocabulário tende ao casual; os blogueiros preferem "mas" a "no entanto". Não alegam uma falsa onisciência, e preferem proclamar sua subjetividade. E a escrita em geral é bem crua, não muito editada. Isso é uma grande vantagem.

Em "Major Memory for Microblogs", um recente artigo em "Memory & Cognition", uma publicação científica, os pesquisadores apontavam que as pessoas têm mais facilidade para se lembrar da escrita casual de posts no Facebook ou comentários em fóruns de discussão do que de trechos de livros ou artigos jornalísticos. Um possível motivo é que "a produção espontânea e não muito filtrada da mente de uma pessoa é exatamente o tipo de coisa que a mente alheia armazena com facilidade". É provavelmente por isso que o Twitter, o Facebook e os reality shows de TV se tornaram sucessos.

A produção não filtrada das mentes humanas é muitas vezes estúpida. Mas não necessariamente. Acadêmicos laureados com o Prêmio Nobel também usam o Twitter. Pode-se dizer coisas brilhantes em estilo casual e coloquial (a não ser, talvez, que você seja um astrofísico).A prosa coloquial aumenta as chances de que aquilo que você tem a dizer seja lido e compreendido. É verdade que outros estilos também são válidos. Jane Austen escrevia formalmente. Mas para um escritor médio, sem talentos especiais, o estilo coloquial parecer ser o melhor. (A outra dica para quem quer ser entendido é contar uma história humana, um conselho que sempre me sinto tentado a oferecer a palestrantes que palestram com ajuda de diagramas.)

É claro que a má escrita continua a ser abundante. A revista satírica "Onion" adora parodiar a prosa jornalística, como nessa falsa reportagem que aponta o líder norte-coreano Kim Jong-eun como o homem mais sexy do mundo: "Com seu rosto redondo e devastadoramente belo, seu charme juvenil, e sua estrutura robusta e forte, esse gostosão barbado de Pyongyang é o sonho de toda mulher". E a escrita ao modo antigo também sobrevive, como em uma recente coluna sobre insônia: "As horas liminares entre a noite e a aurora continuam a assombrar minha práxis agora que o ninho se esvaziou".

Mas no geral as mídias sociais ajudaram muito a escrita. George Orwell, em 1944, lamentava a distância entre a verbosidade e formalismo do inglês escrito e o ritmo muito mais animado da fala: "O inglês escrito está repleto de gírias", ele escreveu, "é abreviado sempre que possível, e pessoas de todas as classes sociais tratam sua gramática e sintaxe com descuido". O ideal dele era uma escrita que se parecesse com a fala. Por fim estamos chegando lá.
Tradução de PAULO MIGLIACCI

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