segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Volte a acreditar em sua criatividade (Parte 2)




Por Tom Kelley e David Kelley
(continuação)
Medo de ser julgado
Se a criança que canta, rabisca e dança simboliza a livre expressão da criatividade, o adolescente desajeitado representa o oposto: alguém que se importa — e muito — com o que os outros pensam. Esse medo da opinião alheia se instala em questão de anos, mas permanece conosco a vida adulta inteira, não raro tolhendo o avanço profissional da pessoa. Na hora de aprender a esquiar, por exemplo, a maioria de nós aceita que os tombos vão ser presenciados por outros, até um ponto em que a prática começa a dar frutos. Não dá, no entanto, para arriscar nosso ego profissional da mesma forma. O resultado é a autocensura. Descartamos ideias potencialmente originais por medo de que o chefe ou os colegas testemunhem um eventual tombo. Vamos com soluções ou sugestões “seguras”. Ficamos na nossa — os outros que se arrisquem! Só que uma pessoa que está sempre se censurando não vai conseguir ser criativa.
Parar de se julgar já é meio caminho andado. Ouvir a própria intuição e dar vazão a mais de suas ideias (boas e ruins) significa que você já está progredindo na superação desse medo. Avance aos poucos, como fez o pessoal da cobra lá atrás. Se uma ideia passou por sua mente, não deixe que se perca. Registre tudo, de forma sistemática, em um caderninho especial. Instale um quadro branco, com caneta e tudo, no chuveiro. Programe espaços “em branco” na sua agenda diária, momentos reservados exclusivamente para pensar ou ir dar uma volta e divagar. Ao tentar gerar ideias, tenha cem como meta, não dez. Se suspender o próprio juízo, ao final da semana você ficará surpreso com a quantidade de ideias — e ideias boas — que teve.
Outra dica é mudar o discurso ao dar  feedback e incentivar seus colaboradores a fazer o mesmo. Na d.school, quando damos nossa opinião sobre alguma coisa, em geral abrimos a frase com algo como “Gostei/Achei bom que...”, para depois seguir com um “Gostaria que...”. É melhor do que dar um parecer desmotivante como “Isso aí não vai funcionar”. Frisar aspectos positivos já de cara e usar a primeira pessoa para dar sugestões é como dizer: “Esta é minha opinião, nada mais, só quero ajudar”. Com isso, o interlocutor fica mais aberto a suas ideias.
Há pouco, trabalhamos com a Air New Zealand para reinventar a experiência do cliente em voos longos. Por operar em um mercado regulamentadíssimo, companhias aéreas são conservadoras. Para superar a norma cultural do setor — que é de ceticismo e cautela —, partimos com um workshop para geração de ideias fora do comum. Fizemos protótipos de coisas ousadas (em certos casos, aparentemente inviáveis) sugeridas por executivos, incluindo cintos para segurar passageiros em pé, assentos voltados um para o outro em torno de uma mesa e até redes e beliches. Já que todos estavam fazendo o mesmo, ninguém temia ser julgado. Essa disposição a considerar ideias bizarras e a suspender o juízo fez a equipe ter uma ideia inovadora: o Skycouch, uma poltrona-cama na classe econômica. A princípio, parecia impossível conseguir a proeza sem aumentar a área ocupada (poltronas de primeira classe e classe executiva ocupam muito mais espaço). Mas foi possível, sim. Funciona assim: a poltrona do Skycouch tem uma seção estofada que, quando erguida (como se fosse um apoio para os pés), transforma o espaço em uma plataforma perfeita para duas pessoas deitarem lado a lado. Hoje, uma série de voos internacionais da Air New Zealand oferece a opção, que rendeu vários prêmios à companhia aérea.
Medo de dar o primeiro passo
Mesmo quando temos uma ideia criativa e a reconhecemos, tirar a coisa do papel traz seus próprios desafios. Em empreitadas criativas, o mais difícil é o começo. No caso do escritor, é a página em branco. No do professor, o início das aulas. No de executivos, o primeiro dia de um novo projeto. De modo mais geral, também estamos falando do medo de traçar um novo caminho ou de sair do ritmo de trabalho previsível. Para superar essa inércia, uma boa ideia não basta. É preciso parar de planejar e arregaçar as mangas — e a melhor saída, aqui, é parar de pensar na imensa empreitada como um todo e buscar uma parte pequena dela que possa ser abordada de imediato.
A escritora americana Anne Lamott resume muito bem essa ideia em uma história de sua infância. O irmão tinha de fazer um trabalho de escola sobre o tema “pássaros”. Mas só foi abrir o caderno na véspera. Estava quase chorando, aflito com o dever à sua frente, quando o pai veio e lhe disse: “Vai de pássaro em pássaro, filho. Um passarinho por vez”. Em um contexto empresarial, um empurrão para dar o primeiro passo seria se perguntar: qual o experimento que custa pouco? Qual a forma mais rápida e barata de avançar rumo à meta maior?
Outra ideia é estipular, para si mesmo, um prazo insano. Foi o que fez John Keefe, estudante da d.school e editor sênior da estação de rádio nova-iorquina WNYC, ao ouvir um colega se queixar de que a mãe, que usava o transporte público, vivia à espera de um ônibus sem ter ideia de quando o próximo chegaria. Se trabalhasse para a Secretaria dos Transportes de Nova York e seu chefe lhe pedisse para resolver o problema, em quanto tempo você prometeria ter um sistema instalado e operando? Seis semanas? Dez? John, que não trabalha na prefeitura de Nova York, pediu “até o fim do dia”. Conseguiu um número 0800, descobriu como acessar dados em tempo real sobre a frota de ônibus da cidade e ligou a informação a tecnologias de conversão de texto em voz. Em 24 horas, tinha criado um serviço que permitia ao passageiro ligar para a central, dar o número da parada de ônibus e ouvir a localização do próximo coletivo. John aplica essa mesma atitude destemida ao trabalho na rádio. “A meu ver, a melhor maneira de praticar o ‘design thinking’ é fazer, em vez de falar”, explica.
Outro exemplo da estratégia de começar de pouquinho vem de um projeto da IDEO para criar um novo painel para um carro de luxo na Europa. Para testar as ideias, os designers filmaram um carro na versão atual e, usando efeitos digitais, foram inserindo coisas novas no painel. Rápido, o processo de prototipagem consumiu menos de uma semana. Quando a equipe mostrou o vídeo ao cliente, ele riu. “A última vez que fizemos algo assim, construímos um protótipo de verdade, o que levou quase um ano e custou mais de um milhão de dólares”, contou. “Só então fizemos um vídeo. Vocês pularam a parte do carro e foram direto para o vídeo.”
Nosso mantra é “Pare de se preparar, entre em ação!”. O primeiro passo vai parecer muito menos intimidante se for pequeno e se você se obrigar a dá-lo já. Em vez de enrolar e deixar a ansiedade ir crescendo, comece a caminhar, aos pouquinhos, rumo à cobra.
Medo de perder o controle
Ter confiança não significa simplesmente acreditar que suas ideias sejam boas. Significa ter humildade para abandonar ideias que não estão funcionando e aceitar boas ideias dos outros. Quando deixa de lado a velha ordem das coisas e vai trabalhar de forma colaborativa, você sacrifica o controle sobre o produto, a equipe e a empresa. Mas o que ganha, em termos de criatividade, pode mais do que compensar. De novo, comece de pouco. Se estiver enfrentando um desafio complicado, tente convocar gente alheia ao tema para uma reunião. Ou, então, quebre a rotina de uma reunião semanal. Como? Deixando que o menos graduado dos participantes defina a pauta e conduza a sessão. Busque oportunidades de ceder o controle e de explorar perspectivas distintas.
Foi exatamente o que fez Bonny Simi, diretora de planejamento em aeroportos da companhia aérea JetBlue Airways, depois que uma tempestade de neve deixou o Aeroporto Internacional JFK, em Nova York, seis horas fechado em 2007, causando um pandemônio nas operações da empresa pelos seis dias seguintes. Todo mundo sabia que havia problemas operacionais a serem corrigidos, mas ninguém sabia exatamente o que fazer. Bonny, que acabara de fazer um curso na d.school, sugeriu que a JetBlue fosse buscar soluções nas bases da empresa, não na cúpula. Primeiro, reuniu, durante um dia, uma equipe de 120 funcionários da linha de frente: pilotos, comissários de bordo, pessoal de bagagem, funcionários de rampa, planejadores da tripulação e outros. Em seguida, listou suas ações para solucionar os problemas (em post-its amarelos) e desafios que enfrentavam (em post-its cor-de-rosa). No final do dia, essa força-tarefa tinha chegado a novos insights — e a um novo grau de determinação. A equipe distribuída passou os meses seguintes esmiuçando mais de mil post-its rosados para resolver de forma criativa cada problema. Ao admitir que as respostas estavam na coletividade, Bonny fez mais do que poderia ter feito sozinha. E, hoje, a JetBlue se recupera de grandes distúrbios bem mais depressa do que antes.
Nossa própria experiência com a plataforma de inovação aberta OpenIDEO é outro bom exemplo. Foi com medo que lançamos a empreitada: primeiro, porque iríamos deflagrar um diálogo público que podia rapidamente escapar ao controle; segundo, porque estávamos admitindo que não temos resposta para tudo. Mas, assim como a turma que se tratou com Albert Bandura, estávamos prontos para dar um salto maior — para tocar a cobra. E logo descobrimos os benefícios. Hoje, a comunidade OpenIDEO inclui cerca de 30 mil pessoas de 170 países. Pode até ser que nunca se encontrem em pessoa, mas juntas já fizeram a diferença em dezenas de iniciativas — de ajudar a revitalizar cidades em declínio econômico a testar protótipos de serviços de ultrassom para gestantes na Colômbia. Descobrimos que, independentemente do grupo ao qual a pessoa pertença ou no qual trabalhe, sempre há mais ideias fora do que dentro dele.
Para gente com origens tão diversas como as de Akshay, Ankit, John e Bonny, o medo — do desconhecido, de ser julgado pelos outros, de dar o primeiro passo, de soltar as rédeas — poderia ter bloqueado o caminho para a inovação. Mas não. O que os quatro fizeram foi trabalhar para superar seus medos, redescobrir sua confiança criativa e fazer diferença. É como disse certa feita o ensaísta húngaro György Konrad: “A coragem é o mero acúmulo de pequenos passos”. Não fique, portanto, parado na linha da largada. Deixe o medo de lado e comece hoje mesmo a praticar a confiança criativa. 

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