quinta-feira, 25 de abril de 2013

Você tem o nível ideal de inteligência emocional?

Por Amanda Camasmie

Um grupo de crianças com quatro anos de idade foi colocado em uma sala para um experimento. Cada uma podia ver à sua frente um marshmallow apetitoso. Os pesquisadores entraram na sala e disseram que se elas esperassem quatro minutos antes de comer o doce, poderiam ganhar dois dele. Algumas crianças se contiveram, outras não. Foi acompanhado o progresso delas ao longo dos anos com mais testes e os pesquisadores perceberam que as crianças capazes de esperar pelo segundo marshmallow se tornaram mais confiáveis e equilibradas. Elas tinham melhores notas e melhor relacionamento com os colegas em comparação às crianças impulsivas. O resultado? Elas se tornaram adultos mais bem-sucedidos.


O teste do marshmallow, feito em 1960 por Walter Mischel, da Universidade de Stanford, ganhou notoriedade na década de 1990 por meio do jornalista e psicólogo Daniel Goleman. Em seus estudos sobre inteligência emocional, Goleman citou que os adultos que se tornaram bem-sucedidos, desde crianças, já tinham a capacidade de controlar seus impulsos e adiá-los por uma boa razão. E em 1995, ele publicou o best-seller "Inteligência Emocional".
O assunto ganhou a capa da revista Time e Goleman tornou-se referência no assunto. Empresas e escolas de negócios começaram a prestar atenção no conceito, que segundo Goleman, se traduzia na capacidade de identificar os nossos próprios sentimentos e os dos outros, de nos motivarmos e de gerir bem as emoções dentro de nós e nos nossos relacionamentos. O QI (Quociente de Inteligência) havia perdido o seu reinado para o QE (Quociente Emocional).
Segundo Goleman, os bons resultados em qualquer área de atuação dependiam apenas de 20% de QI e de 80% de QE. Com essa tese ele sublinhava que a inteligência emocional seria a maior responsável pelo sucesso ou insucesso dos indivíduos. Alguns anos se passaram e ela já não é mais considerada a solução de todos os problemas, segundo Sérgio Averbach, presidente da Korn/Ferry Internacional para a América Latina. “Inteligência emocional foi muito valorizada há dez, vinte anos. Nesse período foi considerada a competência mais importante, a que seria a solução de todos os problemas. Não é”, afirmou.
Ao leitor mais impulsivo, acalme-se. Ela continua sendo de extrema importância, mas agora faz parte de um conjunto muito maior. “É um repertório, um conjunto. Faz parte dos grupos de competências. Um grupo é o de competências emocionais e o segundo é o grupo de competências de influência”, diz. Em conversa com Época NEGÓCIOS, Averbach explicou como é vista a inteligência emocional nas empresas no século XXI. Confira.
Qual é a importância da inteligência emocional nas empresas?
Nos últimos anos, os nossos estudos mostram que inteligência emocional é um pilar de sustentação para profissionais que tem um impacto importante em resultados. O primeiro indicador de inteligência emocional é perceber se o profissional tem uma auto-avaliação precisa. Ele precisa ter a capacidade de se enxergar como ele realmente é ou o mais próximo do que realmente é. Outro indicador é a compostura. A capacidade de lidar com situações difíceis mantendo o eixo. Não significa ser frio, não significa não ter reação. Significa conseguir manter a calma ou a relativa calma, o controle das emoções, para conseguir ter raciocínio e tomar as ações necessárias com a intensidade necessária.
Como atingir essa intensidade necessária?
Mais de 90% da população pensa que é importante ter uma determinada competência. Quanto mais competência você tem, melhor você é. Quanto mais você usa essa competência, melhor é. Intuitivamente, isso parece verdade. Não é. Os dois são ruins, tanto para mais, quanto para menos. Toda competência tem o ponto ideal. Como se mede o exagero? Pela frequência do uso e pela energia que a pessoa coloca. Vamos pensar em inteligência emocional. Para menos, a pessoa não tem equilíbrio emocional, perde as estribeiras. Em uma situação de crise, sai gritando. E quem não tem muita inteligência emocional parece ter tanto controle que não demonstra emoção. Parece feito de gelo, não tem empatia. Outro exemplo é o follow-up. Em qualquer profissão é importante fazer follow-up. Existe um ponto certo e uma técnica correta. A pessoa que faz para menos, a consequência é que as coisas não acontecem, não há resultados. Se ela faz para mais, logo já questiona “Você já fez isso, você já escreveu?”. A pessoa não dá nem tempo para os seus colegas chegarem ao escritório e refletirem sobre o assunto. Humildade é outro exemplo. Humildade de menos projeta uma pessoa arrogante, humildade demais, a pessoa não consegue se impor.
Você citou que inteligência emocional não é mais tão importante quanto as pessoas imaginavam. Por quê?
Ela continua sendo importantíssima e fundamental. Mas ela não é importante sozinha como se pensava antigamente. Esse conceito foi interpretado como a tábua da salvação há dez, vinte anos para a resolução de todos os problemas. Inteligência emocional continua sendo um pilar, mas não é a solução de todas as questões. É um repertório, um conjunto. Faz parte dos grupos de competências. Um grupo é o de competências emocionais [na tabela abaixo] e o segundo é o grupo de competências de influência. O que significa esse último grupo? É aprender como influenciar pessoas, e influenciar para o bem. Entenda que influenciar é diferente de manipular. Depois de entender como influenciar, é preciso saber como tomar a decisão e isso implica em como buscar a informação. Tem gente que busca a informação dizendo apenas “Nós vamos por aqui”. E as pessoas perguntam “Como você decidiu que iríamos por esse caminho?”, “Pela minha experiência”, esse líder responde. As pessoas se acham as donas da verdade e muitas vezes levam a empresa à falência por conta disso. Ou leva a morte da pessoa, se for um médico. Já viu filmes de pronto-atendimento? Os médicos conversam o tempo todo. O profissional que trouxe o paciente na ambulância já reporta tudo ao médico quando chega. Em uma empresa é a mesma coisa. Quanto mais importante é a decisão, quanto maior impacto terá no resultado, mais o líder precisa ir atrás das informações.
COMPETÊNCIAS EMOCIONAIS
Tolerância à ambiguidadePessoas capazes de lidarem confortavelmente com situações que não podem ser antecipadas ou fogem das expectativas. Incerteza, variedade, novidade, diversidade, mudanças, falta de clareza, falta de estrutura e de rotina são exemplos de ambiguidade. Quem souber encarar todas essas questões de forma eficaz, pode dizer que tem essa competência.
Compostura
 
Saber lidar com tarefas e problemas complexos pensando claramente e com calma. Para a maioria das pessoas, fatores de estresse, como riscos e conflitos, aumentam as reações emocionais (como medo e raiva) e interferem na capacidade de resolver problemas complexos em que é preciso pensar objetivamente e analiticamente.
EmpatiaSaber ganhar a compreensão de outras pessoas. Inclui a capacidade de analisar com precisão as habilidades e motivações das pessoas, incluindo os pontos fortes e fracos. Envolve ainda a sensibilidade às diferenças, saber compreender os diferentes pontos de vista.
EnergiaConseguir encarar tarefas difíceis durante longos períodos de tempo. Capacidade de lidar com decepções e fracassos para realizar os objetivos e tarefas. Pessoas com muita energia geralmente têm uma imagem positiva de si mesmas.
HumildadeEssa competência emocional se refere à capacidade de se adaptar a diferentes pessoas e/ou circunstâncias. Essas pessoas podem modificar o comportamento rapidamente para lidar com diferentes tipos de pessoas e situações. São pessoas geralmente fáceis de trabalhar e ótimas para se ter na equipe.
ConfiançaEssas pessoas acreditam serem capazes de superar quaisquer obstáculos. Dê a elas desafios, que envolvam riscos e problemas complexos. Quem não tiver essa competência, irá preferir assumir tarefas facilmente controláveis, com poucos desafios.
E para colher essas informações, é preciso olhar o cenário externo, conversar com pessoas-chave?

Exatamente. E muitas vezes, as pessoas-chave são o chão de fábrica, o vendedor. O líder tem de ter o pulso do que está acontecendo. Se ele não vai direto à fonte, a informação vem truncada. A gente aprende isso quando ainda é criança, com o telefone sem fio. O último da fila entende uma coisa totalmente diferente.

A inteligência emocional pode ser desenvolvida?

Com certeza. As empresas têm processos de treinamento e de desenvolvimento profissional. Mas não podem só fazer treinamento, porque essa é apenas uma das formas de desenvolvimento profissional. A melhor forma de desenvolvimento é expor o indivíduo a desafios. São experiências no próprio trabalho. Toda competência pode ser desenvolvida.

Pode descrever um profissional com inteligência emocional?

Em situação de estresse mantém a compostura, tem paciência, é cortês, respeita os limites das outras pessoas. Tem tolerância à ambiguidade. Nas situações ambíguas ele tem paciência para lidar com as situações até que a questão se clarifique. As empresas têm essas situações com muita frequência. Você recebe orientação de uma pessoa e daqui a pouco recebe orientação de outra. Quem tem baixa inteligência emocional vai estourar. A pessoa equilibrada vai dizer: “Me explica melhor, por qual razão você está me dando essa orientação. Diga a sua visão. Eu recebi outra orientação anterior, você quer que eu te diga para que possamos entender melhor a sua visão?”.

Como identificar se uma pessoa tem essa competência?

É uma combinação de coisas. A principal referência são os pais. Um bom entrevistador sabe fazer as perguntas corretas. Ele tenta entender qual foi a relação do indivíduo com os pais, qual era a profissão deles, quantos irmãos esse profissional tinha. Tudo começa com a formação dos pais. Os meus eram daqueles que filmavam os meus campeonatos esportivos e de meus irmãos. Eles deram formação musical para todos, sempre estavam nos assistindo, incentivando. Faço o mesmo com as minhas filhas. Toda a apresentação que elas faziam na escola, eu cancelava meus compromissos para assisti-las. Eu era o único pai que levava câmera e tripé, pra imagem não tremer. Sou o único hoje que tem vídeos espetaculares das minhas filhas editados por profissionais. Isso faz a diferença, a presença dos pais cobrando, exigindo até onde a criança consegue dar. A exigência de primeiro o trabalho depois o lazer são os valores familiares. Isso vai compor o tecido dos valores do indivíduo. Não é o tecido dos valores dos amigos.

E quando os pais não têm esses valores? A pessoa também pode fazer o oposto do que eles “ensinavam”, não?

Ouvi uma palestra do Flávio Gikovate [psiquiatra e psicoterapeuta] em que ele dizia “Quando os pais têm os valores alinhados, a probabilidade de o filho dar certo aumenta drasticamente. Quando os pais têm os valores desalinhados, a probabilidade de dar errado aumenta drasticamente”. Não se trata de pais terem ou não valores. Todo mundo tem valores. Até Hitler tinha valores, o que ele não tinha eram princípios. Os valores são individuais. Um assassino acredita que matar é ok, porque é um valor dele. Mas ele não tem princípios, porque um dos princípios universais é não matar. O primeiro passo é identificar o alinhamento dos valores. A melhor forma de você descobrir os valores é através de exemplos reais, de situações reais. É perceber como as pessoas se comportaram. É entender o “como”. As melhores entrevistas são as que perguntamos “Me conta como você fez isso”, “Me conta como isso aconteceu”. Vamos cavando para extrair a verdade.

Quais perguntas não podem faltar na hora de escolher um profissional?

Vou responder essa pergunta de duas formas. Primeiramente, vou dizer quais perguntas as pessoas fazem e não agregam em nada. “Quais são suas forças e fraquezas” é uma delas. É uma pergunta clichê, com respostas que as pessoas querem ouvir. Se o indivíduo não tem uma auto-avaliação precisa, a resposta dele será totalmente distorcida. Outra pergunta irrelevante é “Me fale de você”. O que a pessoa quer com isso? Você quer que eu te conte a história profissional, os meus traumas de infância, as minhas vitórias? Em que as pessoas focam? Nas vitórias. Nós aprendemos com as derrotas e as pessoas não falam delas. A pergunta certa é “Me conta um ou dois exemplos de coisas que você errou e o que você aprendeu com esse erro”. Depois é ver se o entrevistado tem a coragem, que é uma outra competência emocional, de falar sobre o erro e o que aprendeu com ele. E que não errou de novo na próxima situação. Porque aí entra o conceito mais importante da atualidade, assim como se falava há dez anos de inteligência emocional, que é a agilidade de aprendizagem. Errar é humano, agora o que você faz com o aprendizado do erro é que traz genialidade. É claro que se aprende com os acertos, mas você aprende muito mais com os erros em uma proporção de 100 para um. Você realmente aprende com os pequenos erros e não com os grandes, porque eles são traumatizantes. Há quatro anos, entrou um profissional jovem na minha sala. Ele estava muito preocupado. Tinha cometido um erro. Disse a ele: “Como posso te ajudar?”. Ele não sabia. Então eu disse, vamos analisar juntos. No final da reunião, ele disse: “Estou tão impressionado. Achei que fosse tomar a maior bronca”. E eu respondi: “Por quê?” ; “Porque eu errei”. E eu rebati “Errar é humano, eu também errei quando tinha a tua idade. Estou aqui para te ajudar, para você superar esse desafio. Você está representando a firma”. Esse profissional está sendo promovido a diretor hoje. Quando um líder consegue passar esse aprendizado com os erros, isso gera um efeito multiplicador maravilhoso.

Como fazer uma auto-avaliação precisa?

Existem vários instrumentos. As empresas desenvolveram metodologias e processos para o profissional fazer uma auto-avaliação. São algoritmos onde o profissional deve responder a uma série de perguntas e o sistema faz uma checagem cruzada das respostas com as estatísticas. Esse algoritmo cruza as informações do executivo e dá um laudo. Esse laudo é perfeito? Não. É como fazer um raio-X ou fazer uma tomografia. Assim como os médicos e cirurgiões têm os instrumentos e evidências para tirar pareceres mais confiáveis, hoje nós temos esses instrumentos cujas respostas são validadas em processos de entrevistas de profundidade, com perguntas que irão descobrir a agilidade de aprendizagem.

Quais outras perguntas não podem faltar em uma entrevista?

Obtenha exemplos de situações reais recentes e semelhantes às que ele vai ter na nova empresa. Entenda como o profissional agiu e reagiu. Se ele não tiver exemplos recentes, peça a ele situações antigas ou em qualquer esfera, pode ser na pessoal. Quer ver um exemplo de pergunta bárbara? O presidente do Google no Brasil, o Fábio Coelho, é um dos meus melhores amigos. Ele me deu a dica pra essa pergunta: “Me conta um exemplo de uma situação onde você fez algo realmente diferente e extraordinário”. Deixe a pessoa pensar por alguns instantes. Diga a ela para não se preocupar se essa experiência foi recente, se foi no trabalho, se foi em esporte, em atividade empreendedora. E o profissional não deve se preocupar se a experiência deu certo. Com isso, você descobre o que esse indivíduo fez de iniciativa, de participação, que tenha sido algo extraordinário. Tem uma profissional aqui dentro que contou uma história de quando era jovem. Ela treinava ginástica olímpica. É alta, nova. Existe dificuldade em se fazer essa modalidade sendo alta e ela contou sobre isso. Com a história dela, consegui identificar traços de persistência, perseverança, energia, foco no que ela acredita. Claro que ela tinha um bom histórico e também tinha trabalhado em boas empresas. Mas quando a resposta é vazia, e eu não consigo identificar esses indicadores, comunico que não será um dos líderes, não será um dos nossos sucessores. Você não consegue ter uma equipe só de time dos sonhos.

E as respostas padrões?

Uma resposta padrão que também não aguento mais ouvir: “Adoro desafios”. Pense bem, você adora desafios ou você adora estar na praia com os seus amigos?

Você já errou muito em uma contratação?

Já errei. Contratei uma vez um profissional para uma posição sênior. Eu me sentia sob forte pressão dos meus líderes para fazer essa contratação, que era urgente para nós. Era uma posição crítica porque eu estava contratando um dos principais líderes para a América Latina, em um momento de crise mundial. Sigo um processo rigoroso nas nossas contratações. Já fiz muitas contratações, troquei a minha equipe de liderança inteira, pessoas que se aposentaram, que saíram. Passei pelo protocolo de entrevistas e errei. Não deu certo. O que não deu certo? Olha o paradoxo. Esse líder trouxe bons resultados financeiros e econômicos. Muito bons. Os números, esse profissional atingiu. Mas ele era desalinhado com os valores da firma. Eu não valorizei como deveria ter valorizado o desalinhamento com os valores da companhia. Uma das principais razões pelas quais os recrutamentos não dão certo é o choque de valores. Exemplo de valores: um apoia o outro. A briga está lá fora, a briga não está aqui dentro. Temos diferentes visões aqui dentro? Claro que temos. Por isso temos várias salas de reunião. A cultura é: tem problemas? Senta em uma sala e converse numa boa. Mas esse profissional era solitário. Eu não levei isso em consideração no momento da decisão. Eu já tinha identificado essas evidências, mas no momento elas me pareceram pequenas. Aprendi que a intuição informa. A minha intuição me informou que alguma coisa estava errada. O que é intuição? Ela vem de experiências passadas que trazem informações que você não consegue verbalizar de uma maneira estruturada. Eu subestimei a minha intuição. Se eu tivesse ido mais fundo nessas questões, lembrando que o alinhamento cultural é tão importante quanto as demais dimensões, esse erro não teria sido feito. Nunca mais eu cometi esse erro.

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